quarta-feira, 29 de setembro de 2010

A NOVA DISCIPLINA DA CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO E A RELAÇÃO DE EMPREGO

A NOVA DISCIPLINA DA
CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO
E A RELAÇÃO DE EMPREGO

Rodolfo Pamplona Filho*

Sumário: 01. Considerações introdutórias. 02. Fundamentos da consignação em pagamento. 03. A consignatória extrajudicial. 03.01. Aplicabilidade à relação de emprego. 04. A ação de consignação em pagamento. 05. O procedimento judicial trabalhista da ação de consignação em pagamento. 06. Prazo para ajuizamento da ação de consignação em pagamento. 07. Considerações finais. 08. Bibliografia consultada.

01. Considerações introdutórias.

A Lei nº 8.951, de 13.12.1994, integrante de um amplo conjunto de inovações para o vigente Código de Processo Civil, trouxe diversas e profundas modificações na disciplina da consignação em pagamento.
Estas mudanças na processualística civil não poderiam deixar de ter implicações no processo do trabalho, haja vista que não há uma regulamentação específica da consignação em pagamento trabalhista, sendo, portanto, a hipótese de aplicabilidade do art. 769 consolidado (“Nos casos omissos, o direito processual comum será fonte subsidiária do direito processual do trabalho, exceto naquilo em que for incompatível com as normas deste Título”).
Nas palavras de Valentin Carrion, ao “processo laboral se aplicam as normas, institutos e estudos da doutrina do processo geral (que é o processo civil), desde que: a) não esteja aqui regulado de outro modo (“casos omissos”, “subsidiariamente”); b) não ofendam os princípios do processo laboral (“incompatível”); c) se adapte aos mesmos princípios e às peculiaridades deste procedimento; d) não haja impossibilidade material de aplicação (institutos estranhos à relação deduzida no juízo trabalhista); a aplicação de institutos não previstos não deve ser motivo para maior eternização das demandas e tem de adaptá-las às peculiaridades próprias. Perante novos dispositivos do processo comum, o intérprete necessita fazer uma primeira indagação: se, não havendo incompatibilidade, permitir-se-ão a celeridade e a simplificação, que sempre foram almejadas. Nada de novos recursos, novas formalidades inúteis e atrancadoras”.
Este preciso comentário nos parece bastante oportuno para o tema que iremos abordar, eis que, para analisar a forma de aplicação da consignação em pagamento ao processo do trabalho, é preciso se ter em mente as próprias peculiaridades deste último.
Faz-se necessário, portanto, vislumbrar quais as adaptações necessárias para tornar efetiva esta aplicação subsidiária, de modo a evitar que este importante instituto tenha relevância apenas acadêmica para os atores sociais das relações de direito do trabalho.

02. Fundamentos da consignação em pagamento.

A consignação em pagamento, ao contrário do que se possa pensar a priori, não é um instituto típico de direito processual.
Em verdade, sua fonte é, inquestionavelmente, o direito material, constituindo-se em uma das formas legais de extinção de obrigações.
A forma ordinária de extinção das obrigações se dá, obviamente, através do pagamento. Em lapidar e feliz expressão, o pagamento é definido como “a morte natural da obrigação”.
Todavia, pode ocorrer, em determinadas relações obrigacionais, dúvida quanto à pessoa do credor ou mesmo recusa deste em receber o pagamento da forma convencionada.
Nesses casos, pode o devedor, querendo ver-se livre da obrigação, pleitear a consignação da prestação devida, extinguindo-se a relação obrigacional, mesmo sem haver o pagamento "direto".
A primeira observação, portanto, é que a consignação é, indubitavelmente, uma forma de extinção das obrigações, constituindo-se em um pagamento "indireto" da prestação avençada.
Isso porque a consignação visa a evitar que o devedor, cônscio de suas obrigações, fique com a dívida por longo tempo em seu passivo, tal qual "espada de Dâmocles" pendendo sobre sua cabeça, à mercê do arbítrio do credor.
Por isso, podemos compreender, com Antonio Carlos Marcato, que “o pagamento por consignação é instrumento de direito material destinado à solução de obrigações que têm por objeto prestações já vencidas e ainda pendentes de satisfação, pouco importando se essa pendência decorre de causa atribuível ao credor ou resulta de outra circunstância obstativa do pagamento por parte do devedor; e este vale-se de tal instrumento para liberar-se do vínculo que o submete ao accipiens e livrar-se, em conseqüência, dos ônus e dos riscos decorrentes dessa submissão”.
Uma segunda colocação é a de que a consignação em pagamento não é, em verdade, um dever, mas sim mera faculdade do devedor, que não pôde adimplir a obrigação, por culpa do credor.
É de se ressaltar, na oportunidade, que as obrigações, no que diz respeito ao local do pagamento, podem ser classificadas em duas espécies: obrigações portables, que são as obrigações pagáveis no domicílio do devedor; e as obrigações quesíveis (ou querables), que são a regra geral, em que cabe ao credor ir buscar o adimplemento da obrigação no domicílio do devedor.
No direito positivo brasileiro, até há bem pouco tempo, não tendo sido a obrigação adimplida por mora atribuída somente ao credor, dispunha o devedor única e exclusivamente da via judicial para poder livrar-se da prestação.
Hoje, todavia, em função das profundas modificações do Código de Processo Civil, criou-se um procedimento extrajudicial para resolução do problema, maior novidade no que diz respeito ao pagamento em consignação, cuja finalidade maior, sem sombra de dúvida, é, simultaneamente, aliviar o Poder Judiciário de mais esta quantidade de demandas, permitindo uma rápida resposta - e, por isto, mais efetiva - ao devedor que encontra resistência do credor em receber o que lhe é devido.
Analisaremos com mais vagar essa inovação, porém, no próximo tópico.

03. A consignatória extrajudicial.

O art. 1º. da Lei n. 8.951/94, sem modificar o caput do art. 890 do C.P.C., lhe acrescentou quatro parágrafos, instituindo o procedimento extrajudicial de consignação em pagamento.
Registre-se, entretanto, que embora constitua uma inovação para o direito positivo brasileiro, a consignatória extrajudicial já existe, com bastante eficácia, em outros sistemas jurídicos, notadamente nos países europeus.
Trata-se de verdadeira medida de dessacralização da consignação em pagamento, digna de aplausos, tendo em vista o seu nítido intento de simplificar a solução de conflitos.
O procedimento é por demais singelo, o que demonstra, ainda mais, a busca pela "desburocratização e desformalização, sem violência, mínima que seja, às garantias constitucionais do processo", valendo-nos das palavras do ilustre Calmon de Passos.
"Tratando-se de obrigação em dinheiro, poderá o devedor ou terceiro optar pelo depósito da quantia devida, em estabelecimento bancário oficial, onde houver, situado no lugar do pagamento, em conta com correção monetária, cientificando-se o credor por carta com aviso de recepção, assinado o prazo de 10 (dez) dias para a manifestação de recusa". É o que determina o § 1º do art. 890.
A priori, deve-se observar, de logo, que este procedimento extrajudicial somente é aplicável às obrigações pecuniárias, não sendo possível sua aplicação em relações obrigacionais relacionadas com a entrega de coisa. A consignação de coisa continua somente se dando através da via judicial, o que se explica até mesmo pela falta de uma estrutura específica, de natureza extrajudicial, suficientemente idônea para atuar como depositária do bem consignado.
A determinação de que o depósito deve ser feito em banco oficial parece-nos, contudo, apenas uma preferência legal que objetiva a facilitar eventual procedimento judicial posterior. A inexistência de estabelecimento bancário oficial, na localidade onde deveria ser procedido o pagamento, não deve impedir o devedor de se valer do procedimento, se tem acesso a estabelecimento bancário privado.
A regra, portanto, deve ser compreendida como sendo que o depósito deve ser efetuado em banco oficial, onde houver, podendo ser efetuado em banco privado, na hipótese de inexistência do primeiro . Arriscaríamos, inclusive, a afirmar que provavelmente deve ter havido algum erro de digitação na publicação da lei nº 8.951/94, pois haveria mais sentido se a vírgula registrada após a palavra “oficial” tivesse sido colocada após a expressão “estabelecimento bancário”, lendo-se o dispositivo da seguinte forma: “Tratando-se de obrigação em dinheiro, poderá o devedor ou terceiro optar pelo depósito da quantia devida, em estabelecimento bancário, oficial onde houver, situado no lugar do pagamento, em conta com correção monetária, cientificando-se o credor por carta com aviso de recepção, assinado o prazo de 10 (dez) dias para a manifestação de recusa” (grifos nossos).
Como não há determinação legal expressa, entendemos, ainda, que a cientificação do depósito pode ser procedida tanto pelo estabelecimento bancário (se tiver previsão de procedimento específico), pela via postal, ou mesmo pelo próprio devedor pessoalmente. Exigir-se que tal cientificação somente possa dar-se através do banco soa como um formalismo desnecessário, incompatível e inexplicável se comparado com a proposta de simplificação.
O mais relevante, porém, é que não se abra mão, obviamente, da prova efetiva da ciência ao credor da realização do depósito, bem como a que título entende o autor da consignatória ser devida tal verba. O aviso de recebimento, a que se refere o § 1º, tem justamente esta finalidade.
A expressão "conta com correção monetária" não deve ser interpretada no seu sentido meramente econômico, mas sim jurídico, ou seja, conta com rendimentos que evitem a perda de seu poder aquisitivo, com o desgaste da moeda (atualização monetária). Tal observação se justifica pela possibilidade de a correção monetária não estar instituída expressamente, o que é algo que não se pode deixar de cogitar, principalmente depois dos últimos planos de estabilização econômica.
"Decorrido o prazo referido no parágrafo anterior, sem a manifestação de recusa, reputar-se-á o devedor liberado da obrigação, ficando à disposição do credor a quantia depositada" (§ 2º do art. 890).
O prazo de 10 (dez) dias, fixado no § 1º., deve ter seu termo inicial, de acordo com a atual orientação legislativa e jurisprudencial, a partir da data em que foi efetivamente cientificado o credor, e não, como ocorria outrora no processo judicial comum, do retorno do aviso de recebimento.
A liberação da obrigação, pelo menos nas relações reguladas pelo direito civil comum, se dá sem ressalvas, desde que, logicamente, tenham sido observadas todas as regras legais, notadamente, a prova do silêncio do credor ante a notificação do devedor.
Este é um aspecto que deve ser constantemente relembrado, pois o devedor precisa se precaver de todas as cautelas possíveis para que não haja qualquer nulidade na cientificação. Um interessante exemplo é a possibilidade de o credor estar judicialmente interditado, pelo que seu curador é que deve ser notificado, especificando-se todas as nuances da relação obrigacional a que se refere a consignatória.
Há, portanto, uma presunção da quitação da obrigação avençada, pelo silêncio do credor, somente se admitindo discussão desta se o credor demonstrar alguma irregularidade na sua aceitação tácita do valor depositado. Dessa forma, não podemos concordar in totum com Sérgio Bermudes, para quem "a falta de recusa não obsta à propositura das ações, que o credor tiver contra o devedor, incumbindo ao primeiro opor ao argumento de que não se manifestou as alegações que tiver, como as de não recebimento da carta, de inexistência da mora accipiendi, ou de insuficiência do depósito" . Efetivamente, não só podem, como devem ser conhecidas as alegações de não recebimento da carta, mas jamais se pode aceitar a rediscussão de matéria que deveria ter sido ventilada quando da resposta/recusa ao depósito, sob pena de tirar qualquer validade a essa modalidade extrajudicial de pagamento por consignação.
A hipótese de recusa está prevista no § 3º. do art. 890, que determina que esta deva ser manifestada por escrito ao estabelecimento bancário.
Aí está outro aspecto que nos parece bastante interessante.
A recusa deve ser formulada perante o estabelecimento bancário, e não necessariamente ao devedor/consignante. Isto porque, conforme se pode verificar do § 4º, existe previsão de possibilidade de levantamento do depósito pelo consignante, na hipótese de recusa do credor. Ora, se o depósito é efetuado em nome do credor, por ser quantia que o depositante lhe entende devida, é preciso que o estabelecimento bancário tenha conhecimento da recusa para que possa proceder a liberação do valor ao devedor, caso seja do seu interesse.
Note-se, ainda, que o § 3º fixa também o prazo de 30 (trinta) dias, no caso de haver recusa do recebimento da importância consignada, para que o devedor (ou terceiro) possa propor a ação de consignação, instruindo a inicial com a prova do depósito e da recusa, determinando o § 4º que, caso não seja proposta a ação no referido prazo, ficará sem efeito o depósito, podendo levantá-lo o depositante.
Sobre tais dispositivos, entendemos que a expressão “ficará sem efeito o depósito” é bastante imprecisa tecnicamente, tendo em vista que o depósito de uma quantia é um fato jurídico, sendo completamente inócua a determinação legal, eis que, permanecendo depositada, continuará a importância a ser atualizada monetariamente, tal como se tivesse efetivamente passado para o patrimônio jurídico do credor.
Da mesma forma, mesmo ultrapassado o prazo de 30 (trinta) dias, parece-nos absurdo pensar numa preclusão da possibilidade de ajuizamento da ação de consignação, pois, como veremos a posteriori, enquanto há débito, sempre há a possibilidade de consigná-lo.
Sendo assim, entendemos a fixação do prazo de 30 (trinta) dias somente como uma limitação temporal para o devedor levantar o depósito, na hipótese de haver recusa (vez que havendo aceitação, tácita ou expressa, o valor se transfere ao patrimônio do credor), sendo lógico que, enquanto não houver pronunciamento do consignado (prazo de espera de 10 dias), pode o consignante sacar livremente a quantia depositada.
Neste sentido, concordamos totalmente com Cândido Rangel Dinamarco, quando afirma que a “lei não teve a inconstitucional intenção de fechar o caminho do processo ao devedor que não proponha a demanda naquele prazo de trinta dias: somente facultou-lhe o levantamento do depósito, findo esse prazo. Se ele não o levantar, contudo, nem por isso ficará obstado de propor a ação de consignação em pagamento e exibir a prova do depósito (§ 3º). O legislador não deve tampouco ter pretendido que o devedor levante o depósito e faça outro incontinenti, querendo propor a demanda em juízo após os trinta dias. Carece de eficácia no sistema, também a locução ficando sem efeito o depósito (sempre, § 3º)”.
Encerrando esta breve análise geral da consignatória extrajudicial, consideramos relevante lembrar que ela não se constitui, de forma alguma, em procedimento preparatório necessário para o ajuizamento posterior da ação de consignação em pagamento, mas sim mera faculdade legal, podendo o credor, se desejar, ajuizar diretamente a ação judicial de consignação.

03.01. Aplicabilidade à relação de emprego.

Após analisarmos a inovação legislativa da consignatória extrajudicial, cabe perguntar: tal procedimento é aplicável às relações trabalhistas?
A resposta, baseada na melhor doutrina, não pode deixar de ser positiva.
Inexiste qualquer regulação específica, quanto à matéria, nas relações de trabalho, o que demonstra a omissão do consolidador, bem como a necessidade da subsidiariedade. Da mesma forma, não há incompatibilidade entre o procedimento regulado pelos parágrafos do art. 890 do C.P.C. e os princípios do processo laboral ou mesmo das relações de direito material.
Sendo assim, não existem motivos para se propugnar pela incompatibilidade do novo instituto e todo o seu procedimento com o direito do trabalho.
Todavia, acreditamos sinceramente que, na prática das relações laborais, pouca utilização terá a consignatória extrajudicial.
Nossa convicção se dá, ao contrário de outros ilustres doutrinadores que elencam diversos óbices , por um motivo básico:
O art. 477 consolidado, em seu § 1º, determina que o “pedido de demissão ou recibo de quitação do contrato de trabalho, firmado por empregado com mais de 1 (um) ano de serviço, só será válido quando feito com a assistência do respectivo Sindicato ou perante a autoridade do Ministério do Trabalho” (grifos nossos).
O estabelecimento bancário, mesmo oficial, não pode ser substitutivo do sindicato da categoria profissional ou do representante do Ministério do Trabalho (ou mesmo do Ministério Público, Defensor Público ou Juiz de Paz, para observar a ordem subsidiária do § 3º do art. 477).
Se há expressa determinação legal de que o recibo de quitação, no caso do empregado com mais de 1 (um) ano de serviço, só terá validade quando observada esta homologação, não há como se reconhecer a quitação total e irrevogável através do singelo procedimento extrajudicial aqui analisado.
Obviamente, embora não valha como recibo de quitação das parcelas, não hesitamos em afirmar que, ausente qualquer vício de consentimento, a consignatória extrajudicial fará prova, pelo menos, do pagamento das importâncias que o empregador/consignante considera devidas. Contudo, reconhecemos que isto é efetivamente muito pouco para a segurança das relações jurídicas e empresariais, pelo que o tempo demonstrará que os devedores trabalhistas preferiram optar diretamente pela via judicial para a consignação das importâncias devidas.
Sendo assim, lembramos, neste aspecto, as considerações do Mestre José Augusto Rodrigues Pinto, para quem, “embora impregnada da virtude de aliviar a carga de trabalho do Poder Judiciário, a consignação extrajudicial nos parece ter pouca chance de prosperar na área da relação de emprego, seja pela relativa complexidade do procedimento, envolvendo a participação de estabelecimentos que a média dos trabalhadores não se habituou a freqüentar nem a confiar, como é o caso dos bancos, seja pela tensão natural entre as classes dirigente e trabalhadora, que leva esta última a só confiar nas soluções judiciais, mesmo que nas pesquisas da mídia costume dizer que não confia na Justiça, seja, principalmente, pelos atritos que suscita, graças às diferenças de ordem estrutural do direito material trabalhista e civil”.
Vejamos, agora, algumas noções da ação de consignação em pagamento para, depois, expormos seu procedimento no processo do trabalho.

04. A ação de consignação em pagamento.

A competência ratione loci para julgar a ação de consignação em pagamento continua se dando pelo local avençado para ser procedido ordinariamente o adimplemento da obrigação, conforme se observa do art. 891 (“Requerer-se-á a consignação no lugar do pagamento, cessando para o devedor, tanto que se efetue o depósito, os juros e os riscos, salvo se for julgada improcedente”).
A lei nº 8.951/94 reformulou, entretanto, a redação do art. 893, no que diz respeito aos requerimentos obrigatórios a serem formulados na petição inicial, que passaram a ser “o depósito da quantia ou da coisa devida, a ser efetivado no prazo de 5 (cinco) dias contados do deferimento, ressalvada a hipótese do § 3º do art. 890” (inciso I) e “a citação do réu para levantar o depósito ou oferecer resposta” (inciso II).
Ressalte-se que, pelo rito anterior, o consignado era citado para, “em lugar, dia e hora determinado, vir ou mandar receber a quantia ou a coisa devida, sob pena de ser feito o respectivo depósito”.
Agora, de maneira muito mais célere, o depósito é requerido desde a inicial (podendo já ter sido procedido mesmo antes do ajuizamento, no caso da consignatória extrajudicial - ressalva feita, inclusive, no final do inciso I) e o réu citado, não somente para dizer se aceita o valor, mas também para, na hipótese de recusa, apresentar sua resposta, o que economiza diversos atos processuais.
Note-se, aqui, a precisão técnica do legislador, ao utilizar a expressão genérica “oferecer resposta”, o que implica que o réu poderá não somente contestar, mas também apresentar reconvenção ou exceção.
Obviamente, a diligência da citação do réu somente deve ser procedida após a comprovação do depósito determinado pelo juiz, no prazo previsto no inciso I, do art. 893.
E se, por acaso, este depósito não for realizado?
A hipótese nos parece de extinção do processo sem julgamento do mérito, com indeferimento da petição inicial, pela aplicação analógica do art. 267, I, combinado com o parágrafo único do artigo 284, ambos do C.P.C.
Isso porque sendo o depósito um dos pressupostos necessários para a determinação de citação do réu/consignado, a sua não efetivação impede o curso natural do processo e o conhecimento das alegações fáticas contidas na petição inicial.
Quanto ao prazo para resposta, vale lembrar que houve modificação legislativa neste sentido. O texto original do art. 896 determinava que a “contestação será oferecida no prazo de 10 (dez) dias, contados da data designada para recebimento”. Hoje, contudo, foi suprimida essa fixação específica de prazo para a contestação da consignatória, pelo que deve ser aplicada a regra geral de prazos para resposta do réu no processo de conhecimento, expressa no art. 297 do vigente Código de Processo Civil (“Art. 297. O réu poderá oferecer, no prazo de 15 (quinze) dias, em petição escrita, dirigida ao juiz da causa, contestação, exceção e reconvenção.”).
No nosso entendimento, esse prazo legal de 15 (quinze) dias, no processo civil, tanto serve para oferecer resposta, quanto para levantar o depósito, devendo, em ambos os casos, ser dirigida petição escrita ao magistrado competente.
De acordo com a inteligência da atual redação do art. 896, na contestação, “o réu poderá alegar que:
I - não houve recusa ou mora em receber a quantia ou coisa devida;
II - foi justa a recusa;
III - o depósito não se efetuou no prazo ou no lugar do pagamento;
IV - o depósito não é integral.
Parágrafo único. No caso do inciso IV, a alegação será admissível se o réu indicar o montante que entende devido.”
Trata-se, efetivamente, de um rol das matérias típicas suscitáveis na contestação à consignação em pagamento, eis que este procedimento especial, como já vimos, tem cabimento justamente quando há uma mora accipiendi, ou seja, um atraso ou recusa injustificável do credor em receber a prestação que lhe é devida.
A novidade é a inserção do parágrafo único, que condiciona a possibilidade de alegação da não integralidade do depósito à indicação, pelo credor, do montante que entende devido.
Esta modificação, no preciso comentário de Rodrigues Pinto, “corresponde a uma atitude que vem tomando o legislador, comum ou trabalhista, no sentido de evitar a contestação genérica na discussão de valores, via de regra usada para somente protelar o desfecho da demanda.”
Nossa compreensão da matéria é que se trata efetivamente de uma medida salutar, pois evita a imprecisa defesa por negação geral, possibilitando tanto à parte contrária quanto ao juiz uma melhor visualização dos aspectos controversos do litígio.
As repercussões desta modificação ao processo do trabalho, com a polêmica acerca de sua aplicabilidade, serão analisadas, contudo, no item posterior (“O procedimento judicial trabalhista da ação de consignação em pagamento”).
O art. 897 (“Não oferecida a contestação, e ocorrentes os efeitos da revelia, o juiz julgará procedente o pedido, declarará extinta a obrigação e condenará o réu nas custas e honorários advocatícios”) também foi recentemente modificado, somente para explicitar que, deixando o consignado transcorrer “in albis” o prazo para contestação, devem-se operar os efeitos da revelia, o que, na nossa visão, apenas acrescentou o óbvio, eis que a revelia é um estado de fato, somente se aplicando seus efeitos jurídicos, cujo mais importante é a confissão quanto a matéria de fato, se coerentes com as demais provas constantes nos autos.
Por fim, para encerrar esta análise das modificações da disciplina da ação de consignação em pagamento, impõe-se a verificação do art. 899, cujo caput manteve-se inalterado, mas que ganhou dois parágrafos, nos seguintes termos:
“Art. 899. Quando na contestação o réu alegar que o depósito não é integral, é lícito ao autor completá-lo, dentro em 10 (dez) dias, salvo se corresponder a prestação, cujo inadimplemento acarrete a rescisão do contrato.
§ 1º. Alegada a insuficiência do depósito, poderá o réu levantar, desde logo, a quantia ou a coisa depositada, com a consequente liberação parcial do autor, prosseguindo o processo quanto à parcela controvertida.
§ 2º. A sentença que concluir pela insuficiência do depósito determinará, sempre que possível, o montante devido, e, neste caso, valerá como título executivo, facultado ao credor promover-lhe a execução nos mesmos autos.”
Sobre esta possibilidade de complementação do depósito, comenta Humberto Theodoro Júnior:
“O credor não é obrigado a receber prestação menor ou diversa daquela pela qual se obrigou o devedor. Por isso, o art. 896, nº IV, arrola, entre as defesas úteis, a da insuficiência do depósito efetuado pelo promovente da consignatória. Provada essa defesa, a conseqüência natural seria a improcedência do pedido. A lei, no entanto, por política de economia processual e pela preocupação de eliminar o litígio, instituiu uma faculdade especial para o devedor, quando a defesa se referir apenas à insuficiência do depósito: em semelhante situação, faculta-se ao autor a complementação em 10 dias (art. 899).
É bom lembrar que esse depósito complementar não foi condicionado pela lei nem a erro nem a boa fé do autor, de sorte que se mostra irrelevante o motivo da insuficiência do depósito. Desde que o devedor concorde com a alegação do réu e se disponha a complementar o depósito, aberta lhe será a faculdade do art. 899.”
A introdução do § 1º. é medida de grande utilidade prática, pois evita que haja maior demora do feito, normalmente já bastante lento, quanto à importância incontroversa, prosseguindo o litígio somente quanto à discussão da existência ou não de valores inadimplidos.
No que diz respeito à parte incontroversa, o processo fica, portanto, extinto com julgamento do mérito, eis que houve um “reconhecimento parcial da procedência do pedido”, hipótese que pode ser adequada à previsão do art. 267, II, do Código de Processo Civil.
A única objeção ao levantamento do depósito é bastante razoável, constituindo-se na ressalva do caput do art. 899, no que diz respeito à possibilidade de o depósito corresponder à prestação cujo descumprimento importe na resilição contratual, como é o caso de aluguéis, em que a controvérsia somente pode ser julgada em sua integralidade, mantendo-se o depósito até o julgamento final pelo magistrado competente.
O § 2º se caracteriza como outra saudável medida de simplificação e economia processuais, pois, caso a recusa tenha ocorrido somente pela não integralidade do depósito e restando demonstrada esta alegativa, não precisará o credor ter reconvindo ou mesmo ajuizado ação autônoma, pois a própria sentença que reconhecer a insuficiência do depósito será título executivo judicial em favor do consignante.

05. O procedimento judicial trabalhista da ação de consignação em pagamento.

A ação de consignação em pagamento é, hoje, incontestavelmente admissível no processo do trabalho , não havendo grandes dificuldades em se proceder a adaptação do procedimento previsto no Código de Processo Civil ao rito ordinário do processo do trabalho, de acordo com a orientação do art. 765 da Consolidação das Leis do Trabalho.
No que se refere à petição inicial, apesar de não haver nenhuma determinação expressa neste sentido, recomenda-se que seja feita na forma escrita, até mesmo por analogia a outra ação trabalhista proposta por empregador, que é o inquérito judicial para apuração de falta grave, que somente admite a peça inaugural por escrito (vide art. 853 consolidado).
No processo do trabalho, como sabemos, a relação jurídica processual somente se angulariza (e, portanto, se completa) no momento em que o juiz entra em contato com os autos, o que normalmente só ocorre em mesa de audiência.
Desta forma, em que pese dever constar na vestibular o requerimento de depósito da quantia considerada como devida, a apreciação de tal pleito apenas se dará, na prática, quando da realização da audiência.
Nada impede, porém, que seja criado procedimento administrativo interno na secretaria da J.C.J. ou, onde houver, no setor de distribuição de feitos, para que, ajuizada a petição inicial, seja determinada, de logo, a notificação do autor para proceder o depósito da quantia consignada,
Essa medida, inclusive, é muito mais compatível com o procedimento ordinário do processo do trabalho, principalmente no que diz respeito à regra de concentração de atos em audiência, com a resposta do réu, tentativas de conciliação, instrução e julgamento em uma única sessão. A realização de todos esses atos processuais na mesma data não será possível se a determinação do depósito somente acontecer quando do comparecimento das partes a juízo, haja vista que o consignado terá o prazo de 05 (cinco) dias para procedê-lo.
Determinada com antecedência, portanto, a realização do depósito pelo consignante, sem que esse tenha diligenciado tempestivamente tal mister, o rigor técnico imporá a extinção do processo sem julgamento do mérito, o que é inquestionável, do ponto de vista formal.
Todavia, inexiste obstáculo legal para que, comparecendo os litigantes em juízo para a audiência designada, renuncie o consignado o direito de ter o processo extinto sem julgamento do mérito, aceitando que seja renovada a oportunidade para que o consignante apresente, em audiência, o valor consignado.
Essa conclusão é obtida por uma questão de economia processual, bem como pela regra inscrita no art. 794 consolidado, pelo qual “só haverá nulidade quando resultar dos atos inquinados manifesto prejuízo às partes litigantes”.
Na hipótese em tela, o excessivo formalismo processual de determinar a extinção do processo sem julgamento do mérito, com as partes presentes e o consignado disposto a aceitar a renovação da oportunidade de depósito, implicará apenas no adiamento da apreciação do conflito, o que pode ser muito conveniente para o juiz, que terá um processo a menos para julgar, mas, definitivamente, não o é para os litigantes e, muito menos, para a realização da justiça no caso concreto.
Contudo, se não foi determinado previamente ao consignante que procedesse o depósito, mas tendo sido o consignado notificado (terminologia da CLT), este comparecerá à audiência para receber a importância discriminada na inicial (ou já adrede depositada, na hipótese de eventual consignatória extrajudicial, com recusa do credor trabalhista) ou apresentar resposta (contestação, exceção e/ou reconvenção).
Não comparecendo o consignante, a hipótese será, neste caso inquestionavelmente, de “arquivamento” da ação de consignação, por aplicação analógica do procedimento determinado no art. 844 consolidado, que equivale à extinção do processo sem julgamento do mérito.
Não comparecendo o consignado, apesar de devidamente notificado, declarar-se-á sua revelia, operando-se as conseqüências previstas no art. 897 do C.P.C., com a extinção da obrigação, após o depósito da quantia considerada devida pelo empregador. Excetuam-se da condenação somente os honorários advocatícios, caso não sejam atendidos os requisitos da Lei nº 5.584/70 e Enunciado nº 329 do colendo Tribunal Superior do Trabalho, que regem a matéria na espécie.
Comparecendo o empregado e aceitando a importância consignada, sem ressalvas, o Juízo proferirá decisão, julgando totalmente procedente a consignação, nos termos do parágrafo único do art. 897. A res judicata operar-se-á, obviamente, somente quanto a quitação dos títulos consignados, não abrangendo outras parcelas que não tenham sido objeto da postulação do consignante, podendo o empregado/credor pleiteá-las pela via judicial em ação autônoma, se já não as tiver postulado por reconvenção nos mesmos autos da consignatória.
É lógico que isto não impede que os litigantes transacionem, em audiência, outras ou mesmo todas as parcelas decorrentes da relação de emprego, hipótese em que o termo respectivo, devidamente homologado pelo Juízo trabalhista, valerá como sentença irrecorrível, dando quitação total do vínculo empregatício.
Finalmente, comparecendo o empregado, mas recusando a importância consignada, deferirá o Juiz Presidente o requerimento, formulado pelo empregador, de depósito da quantia considerada devida (caso já não tenha procedido o depósito bancário extrajudicial), tendo o consignante o prazo legal de 05 (cinco) dias para efetuar o depósito.
Havendo apresentação de exceção ou reconvenção, esta será processada da mesma forma que no procedimento ordinário trabalhista, não havendo nenhum aspecto relevante a ser destacado.
Quanto à contestação, a matéria a ser ventilada é, indubitavelmente, a elencada nos incisos do art. 896 do C.P.C., inclusive o inciso IV (“o depósito não é integral”), pois ainda que a determinação para a realização do depósito somente tenha ocorrido naquela oportunidade, o autor da consignação já descreveu, desde a inicial, qual o valor que entende devido, bem como discriminou a que parcelas se refere tal importância.
Há ilustres vozes, como a do ilustre professor e juiz paranaense Manoel Antonio Teixeira Filho, que entendem que o parágrafo único (“No caso do inciso IV, a alegação será admissível se o réu indicar o montante que entende devido.”) do art. 896 seria inaplicável ao processo do trabalho, como se verifica das seguintes considerações:
“Em nossas primeiras impressões sobre o tema, chegamos a aceitar a aplicação dessa regra ao processo do trabalho. Melhor refletindo, porém, assumimos outro posicionamento. Assim o fizemos porque se, em regra, o réu, na ação de consignação em pagamento, é o trabalhador, e se o princípio a ser observado nos direitos material e processual do trabalho é de que o devedor (empregador) só se libera da obrigação até o limite do valor depositado, a opinião, por nós antes sustentada, de que o empregado deveria indigitar, na contestação, o quanto julgava ser-lhe devido, poderia fazer com que o devedor ficasse inteiramente liberado da obrigação, caso o trabalhador deixasse de fazer aquela indicação.
Assim, revendo a primitiva opinião, concluimos que não se aplica ao processo do trabalho o disposto no parágrafo único do art. 896 do CPC, sob pena de antagonismo com o princípio de que o empregador só se libera da obrigação até o limite do valor depositado.
Em suma, a nosso ver, basta que o trabalhador alegue em juízo que o depósito não é integral - como sempre fez, aliás. Se, eventualmente, vier-se a exigir que ele deva apontar o valor a que entende fazer jus, essa exigência terá o caráter de mera informação processual, cuja falta, por isso, não fará com que o devedor fique integralmente liberado da obrigação, máxime se o trabalhador, além de haver contestado, reconveio.”
Com o devido respeito ao ilustre propedeuta, partilhamos definitivamente de outra opinião.
Com efeito, a norma prevista no parágrafo único do art. 896 visa, como já dito anteriormente, a evitar a contestação genérica, expediente utilizado, muitas vezes, com finalidade meramente protelatória.
O fundamento principal dos que defendem a inaplicabilidade do parágrafo único do art. 896 reside no princípio da proteção ao hipossuficiente econômico, vez que o empregado não teria condições de, sozinho, apontar o montante que entende devido.
Afora a discussão de ser esse princípio de direito material aplicável ao direito processual trabalhista, consideramos que, em verdade, o cerne da polêmica está numa fuga inconsciente da tentativa de conciliação entre o jus postulandi pessoal das partes e o ônus processual determinado pela inovação legislativa.
Acreditamos sinceramente que se possa atribuir ao termo “montante” um sentido mais amplo do que o gramatical para se fazer justiça no caso concreto, sem abrir mão da restrição à impugnação genérica.
Como afirmou o juiz mineiro Raul Moreira Pinto, em elucidativo artigo, nada “impede que o empregado-réu, na defesa, simplesmente negue os fatos da inicial ou invoque outros, impeditivos, modificativos ou extintivos do direito do autor. Isto é, afirme que o quantum ofertado é insuficiente porque, v.g., o salário tomado para cálculo de verbas rescisórias não é o efetivamente percebido, ou que há ganhos com horas extras que não foram considerados no cálculo daquelas, ou, mais, que o saldo salarial é maior do que o reconhecido pelo empregador.
Ao elencar os fatos que embasam sua discordância está a lançar sua pretensão de receber valor maior, pretensão esta que o iudicium duplex da consignatória autoriza. Com efeito, retornando aos exemplos acima, o empregado-reú dirá o quantum salarial ajustado, quantas horas extras prestava e qual o valor do salário retido.”
E isto não é novidade no processo do trabalho.
A título exemplificativo, temos a hipótese do § 2º do art. 879 da C.L.T., que determina que “Elaborada a conta e tornada líquida, o Juiz poderá abrir às partes prazo sucessivo de 10 (dez) dias para impugnação fundamentada com a indicação dos itens e valores objeto da discordância, sob pena de preclusão”.
É lógico que, ao pé da letra, a exigência legal é de que o impugnante, na liquidação, apresente contas específicas sobre os valores objeto da controvérsia.
Contudo, não há como se negar que a jurisprudência tem “amenizado” o rigor da norma, conhecendo da impugnação apresentada, mesmo sem cálculos, mas que explicita, um a um, os aspectos discordantes em relação às contas originalmente apresentadas.
Ademais, um outro detalhe não pode ser esquecido.
O § 2º do art. 899, já analisado em tópico anterior, determina que a “sentença que concluir pela insuficiência do depósito determinará, sempre que possível, o montante devido, e, neste caso, valerá como título executivo, facultado ao credor promover-lhe a execução nos mesmos autos” (grifos nossos).
Ora, se toda vez que se alegasse a insuficiência do depósito (inciso IV do art. 896), a indicação aritmética do valor total devido ao consignado fosse obrigatória, não haveria motivo para o legislador inserir a expressão “sempre que possível”
Isso porque inexistiria qualquer impossibilidade, haja vista que a liquidação da sentença seria obtida com uma mera conta de subtração (valor consignado subtraído do valor apontado pelo consignado), acrescida de juros e correção monetária, operação matemática esta que qualquer pessoa, com o mínimo conhecimento de aritmética, é capaz de fazer.
Desta forma, entendemos que, ainda que o consignado não apresente contas demonstrando o valor que entende correto, a sua alegação de que o depósito é insuficiente pode ser conhecida, desde que aponte os motivos pelos quais a importância consignada não corresponde à efetivamente devida.
Com esta visão, consideramos que se tutela de maneira satisfatória o empregado consignado, ao mesmo tempo em que se afasta a simples e pueril alegação de que o valor apresentado pelo consignante é pouco para a remuneração do seu esforço.
Ainda no que diz respeito à alegação de insuficiência do depósito, perfeitamente aplicáveis são também as regras do art. 899, caput, bem como de seu § 1º, que possibilitam a complementação do depósito pelo consignante e o levantamento do valor incontroverso pelo consignado.
Tais medidas possibilitam maior celeridade do processo, devendo ser ressaltado que, de acordo com a estrutura do procedimento dos dissídios individuais do trabalho, o levantamento da importância incontroversa será procedido mediante homologação de conciliação parcial perante o juízo trabalhista, que prosseguirá na instrução da parte controvertida.
Por fim, quanto à sentença, a inovação legislativa conferiu à ação consignatória, na hipótese de depósito incompleto, a natureza de ação dúplice, ao permitir a condenação do autor por força da acolhida da contestação do demandado, sem depender do manejo da reconvenção.
Esta peculiaridade já existia no ordenamento positivo brasileiro para outros tipos de ações, como as de prestação de contas (arts. 914/919 do C.P.C.) e possessórias (vide art. 922 do C.P.C.), bem como a ação de desapropriação, em legislação extravagante.
Tal modificação atende plenamente aos interesses do processo do trabalho, na medida em que aparelha o empregado, de forma imediata, com um título executivo judicial, sem a necessidade de ter de ajuizar ação autônoma para executar a obrigação.
De outro lado, caso seja reconhecido que o valor depositado foi integral, a decisão final será predominantemente declarativa, pois se limitará a reconhecer a eficácia liberatória do depósito promovido pelo devedor. Sendo assim, o que extingue a dívida não é a sentença, mas o depósito do devedor, apenas proclamando a decisão essa extinção.

06. Prazo para ajuizamento da ação de consignação em pagamento.

Um tema que nos parece normalmente olvidado pela maioria dos doutrinadores, mesmo civilistas, que escrevem sobre a consignação em pagamento, é a questão do prazo para seu ajuizamento.
Não se está falando aqui, logicamente, em prescrição, mas sim apenas em momento para ajuizamento da ação correspondente, o que nos parece bastante importante para o processo do trabalho. Isto porque é preciso se lembrar que os §§ 6º e 8º do art. 477 da Consolidação das Leis do Trabalho dispõem, “in verbis”:
“Art. 477. É assegurado a todo empregado, não existindo prazo estipulado para a terminação do respectivo contrato, e quando não haja ele dado motivo para cessação das relações de trabalho, o direito de haver do empregador uma indenização, paga na base da maior remuneração que tenha percebido na mesma empresa.
(...)
§ 6º. O pagamento das parcelas constantes do instrumento de rescisão ou recibo de quitação deverá ser efetuado nos seguintes prazos:
a) até o primeiro dia útil imediato ao término do contrato; ou
b) até o décimo dia, contado da data da notificação da demissão, quando da ausência do aviso prévio, indenização do mesmo ou dispensa de seu cumprimento.
(...)
§ 8º. A inobservância do disposto no § 6º deste artigo sujeitará o infrator à multa de 160 BTN, por trabalhador, bem assim ao pagamento da multa a favor do empregado, em valor equivalente ao seu salário, devidamente corrigido pelo índice de variação da BTN, salvo quando, comprovadamente, o trabalhador der causa à mora”.

Como se vê, a multa prevista no dispositivo supramencionado tem uma razão de ser objetiva que é o atraso no pagamento das verbas rescisórias.
O empregador consignante, desta forma, para evitar a incidência desta multa, terá que ajuizar a ação de consignação no menor prazo possível para demonstrar seu animus de adimplir a obrigação devida.
Lembra Wilson de Souza Campos Batalha que o “art. 477, § 8º, da CLT (redação da Lei n. 7.855, de 24.10.89) comina multa ao empregador que não efetuar o pagamento das quantias devidas ao ensejo da rescisão do contrato de trabalho até o décimo dia contado da data de notificação da rescisão. O pagamento poderá retardar-se por motivos alheios à vontade do empregador, por haver necessidade de assistência do sindicato representativo da categoria profissional ou do Ministério do Trabalho e por haver possibilidade de não comparecimento do empregado no prazo devido. Enseja-se, na hipótese, ao empregador a possibilidade de ingressar em juízo com a ação de consignação em pagamento evitando a aplicação da multa, os juros e a correção monetária, face ao efeito liberatório do depósito.”
O ajuizamento da consignação em data posterior ao vencimento do decêndio legal não implica necessariamente ser automaticamente devida a multa. Para que isto não ocorra, caberá ao empregador o ônus de provar que a mora não se deu por sua culpa exclusiva.
Nas palavras de Arnoldo Wald, “desde que se comprove a mora do credor, não importa que a consignação tenha sido intentada após o vencimento do débito, pois ocorre, no caso, uma simples faculdade e não um dever jurídico por parte do devedor. É todavia recomendável que se faça na data do vencimento do débito ou no dia seguinte.”

07. Considerações finais.

A consignação em pagamento é, como visto, um importante procedimento especial, perfeitamente aplicável ao direito do trabalho.
As inovações trazidas pela Lei nº 8.951/94 trouxeram novas possibilidades na sua utilização, tanto pela instituição da consignatória extrajudicial, quanto pela possibilidade de levantamento do valor incontroverso ou pela nova conotação de actio duplex, na medida em que outorga eficácia executiva à sentença que concluir pela insuficiência do depósito, permitindo ao réu-credor a execução pela diferença.
Entretanto, a eficácia destes novos procedimentos, notadamente no processo do trabalho, dependerá, sem qualquer dúvida, da utilização que os militantes nas lides laborais fizerem deles, sobretudo no que diz respeito a evitar o desvirtuamento dos seus institutos.
O que aqui se defende é que a consignatória seja efetivamente usada como um meio real de solução de controvérsias, e não instrumento de burla aos direitos trabalhistas.

08. Bibliografia consultada.

BATALHA, Wilson de Souza Campos, Tratado de Direito Judiciário do Trabalho, v. II, São Paulo, LTr Editora, 1995.
BERMUDES, Sérgio, A Reforma do Código de Processo Civil, 2ª. ed., São Paulo, Saraiva, 1996.
CALMON DE PASSOS, J. J., Inovações no Código de Processo Civil, 2ª. ed., Rio de Janeiro, Editora Forense, 1995.
CARRION, Valentin. Comentários à Consolidação das Leis do Trabalho. 21ª ed., São Paulo, Saraiva, 1996.
DINAMARCO, Cândido Rangel, A Reforma do Código de Processo Civil, 3ª. ed., São Paulo, Malheiros Editores, 1996.
GIGLIO, Wagner, Direito Processual do Trabalho, 8.ª ed., São Paulo, LTr Editora, 1993.
GOMES, Orlando, Obrigações, 9ª ed., Rio de Janeiro, Forense, 1994.
MARCATO, Antonio Carlos, Ação de Consignação em Pagamento, 5ª ed., São Paulo, Malheiros Editores, 1996.
PINTO, Raul Moreira. “Ação de Consignação em Pagamento - Aplicabilidade dos Novos Dispositivos da Lei nº 8.951/94 no Processo do Trabalho” in Revista “Trabalho & Processo”, vol. 7, São Paulo, Editora Saraiva, Dezembro/1995.
RODRIGUES PINTO, José Augusto, A Modernização do CPC e o Processo do Trabalho, 1ª ed., São Paulo, LTr Editora, 1996.
TEIXEIRA FILHO, Manoel Antonio, As Alterações no CPC e suas Repercussões no Processo do Trabalho, 4ª ed., São Paulo, LTr Editora, 1996.
THEODORO JÚNIOR, Humberto, Curso de Direito Processual Civil, vol III - “Procedimentos Especiais”, 8.ª ed., Rio de Janeiro, Forense, 1993.
WALD, Arnoldo. Curso de Direito Civil Brasileiro. vol. II - “Obrigações e Contratos”, 12ª ed., São Paulo, Editora Revista dos Tribunais, 1995.

sexta-feira, 17 de setembro de 2010

FUNDAMENTAÇÃO MATERIAL DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS NA CONTEMPORANEIDA

FUNDAMENTAÇÃO MATERIAL
DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS NA CONTEMPORANEIDADE

Maurício de Melo Teixeira Branco
Renato da Costa Lino de Goes Barros
Rodolfo Mário Veiga Pamplona Filho

Resumo: Este artigo procura analisar a fundamentação teórica dos chamados direitos fundamentais, estabelecendo a crítica à concepção jusnaturalista, com a finalidade de prestigiar o conteúdo dos princípios da Dignidade da Pessoa Humana e do Estado Democrático de Direito como seus fundamentos epistemológicos.

Palavras-chave: Direitos fundamentais. Dignidade da Pessoa Humana. Estado Democrático de Direito. Fundamentação Material.

Abstract: This article intends to identify what allows recognizing a right as a fundamental right, criticizing its jusnaturalism conception. With this scope, it analyses its epistemological foundations, here identified as the principle of human dignity and the Democratic State of Law.

Keywords: Fundamental Rights. Human Dignity. Democratic State of Law. Materiality of Fundamental Rights.

Sumário: 1. Introdução. 2. Noções gerais sobre os direitos fundamentais. 2.1. A superação da concepção jusnaturalista. 2.2. A existência de um conteúdo material dos direitos fundamentais. 3. Fundamentos de materialidade dos direitos fundamentais. 3.1. O princípio da dignidade da pessoa humana. 3.1.1 O conceito da dignidade da pessoa humana sob a ótica jurídica do ordenamento brasileiro 3.1.2 O conceito da dignidade sob a ótica filosófica. 3.2. O princípio do Estado Democrático de Direito. 4. Conclusão. 5. Referências.


1. INTRODUÇÃO

O presente artigo tem por finalidade tecer considerações sobre os direitos fundamentais na contemporaneidade, buscando a delimitação teórica de sua fundamentação material.
Isso porque há uma profunda cizânia neste tema, com constante invocação de preceitos axiológicos de fundamentação espiritual, para respaldar uma expressão jurídica de conteúdo universalizante, independentemente de credo. Malgrado o seu uso recorrente (ante à vinculação de outras normas aos preceitos que encerram direitos fundamentais), deve ser observado que o tema possui delimitação doutrinária bem definida.
Assim, é preciso compreender o sistema de fundamentação material dos direitos fundamentais a partir de sua própria cognição, o que se pretende fazer nos próximos tópicos.

2. NOÇÕES GERAIS SOBRE OS DIREITOS FUNDAMENTAIS

Propor um conceito unívoco às normas de direitos fundamentais, diante da enorme heterogeneidade das disposições que as disciplinam, é uma tarefa digna de Hércules.
Com efeito, o risco inerente a tal pretensão lastreia-se no fundado receio de que um conceito termine por atuar como cerceador do conteúdo destas regras, não realizando a previsão de efetividade máxima esperada.
Tal missão é normalmente agravada também pela comum tentativa de se vincular a existência de direitos fundamentais a um valor pré-existente, em resgate de um jusnaturalismo divino, o que efetivamente não deve ser feito, diante da superação desta concepção.

2.1. A SUPERAÇÃO DA CONCEPÇÃO JUSNATURALISTA

Para Luis Roberto Barroso , o termo jusnaturalismo “identifica uma das principais correntes filosóficas que tem acompanhado o Direito ao longo dos séculos, fundada na existência de um direito natural”, sendo que tal direito tinha seu valor outorgado por uma ética extra-estatal.
Cumpre destacar que, no decorrer da história, o direito natural foi visto como uma máxima oriunda da vontade de Deus, e, já na idade Moderna, como uma lei ditada pela razão natural.
Sobre este aspecto, pondera Machado Neto :
Durante toda a idade Média, seja sobre o império da patrística, seja da escolástica, os fundamentos do direito natural jamais deixaram de ser a inteligência e a vontade divinas. Trata-se, portanto, aí, de uma teoria jusnaturalista de conteúdo teológico, unicamente compatível com uma sociedade e uma cultura marcadas essencialmente pela vigência de uma crença religiosa, pelo predomínio da fé.
É obra do moderno processo de secularização da vida que a ideologia jusnaturalista abandonasse as raízes teológicas que a alimentaram durante toda a idade média, para ir buscar, na identidade da razão humana, os fundamentos de sua validade perene e universal.

Nesta concepção, ao considerar-se o direito natural, seja como sendo fruto das leis divinas, seja da racionalidade natural, desprestigiava-se, invariavelmente, as potencialidades humanas, uma vez que se desconsiderava o Direito como um instrumento cultural.
Eduardo Bittar , nesta linha, pontua que, “apesar de sua significação histórica e de sua importância para a formação dos modernos direitos humanos, o jusnaturalismo setecentista e oitocentista não constrói uma discussão inovadora nos meandros teóricos da fundamentação do Direito a partir da natureza (phýsis, natura)”.
Em decorrência deste fato, o jusnaturalismo foi perdendo espaço, principalmente, no que concerne às discussões sobre os direitos fundamentais.
Prosseguindo, destaca Eduardo Bittar que se percebeu a necessidade de ver “o Direito sem recorrer a fundamentos tipicamente medievais, ligados às dimensões espiritual e metafísica (lex divina), mas com simples apelo à própria idéia de natureza (natureza humana individual e racional), domínio de estudos filosóficos”.
Neste caminho, vale frisar que melhor sorte não assistiu à iniciativa da mera positivação dos direitos naturais em estatutos de direitos humanos, na fase inicial do positivismo, pois tal atitude vacilou ao admitir que o valor deste direito de índole personalíssima ficasse equiparado aos demais direitos positivados, sem estabelecer um conteúdo diferenciador que expressasse o seu real valor.
Mais uma vez, nas palavras de Eduardo Bittar :
A banalização dos direitos naturais em estatutos de direitos humanos positivados torna-os, além de direito positivo (com valor de qualquer outro conteúdo de direito positivo, na medida em que podem ser revogados e substituídos a qualquer tempo), uma experiência trivializada de direitos, para utilizar-me de uma linguagem empregada por Tércio Sampaio Ferraz Junior. A fungibilidade do que se põe como conteúdo de um “direito humano” torna-o tão frágil e tão substituível quanto qualquer outro direito, na medida em que sua difusão não garantiu a salvaguarda real das pessoas contra o arbítrio

Sobre esta superação da visão jusnaturalista, ligada à dimensão espiritual e metafísica, bem como da experiência positivista, sem estabelecer critérios que demonstrasse o valor diferenciado deste direito fundamental, ensina Luis Roberto Barroso que:
A superação histórica do jusnaturalismo e o fracasso político do positivismo abriram caminho para um conjunto amplo e ainda inacabado de reflexões acerca do Direito, sua função social e sua interpretação. O pós-positivismo é a designação provisória e genérica de um ideário difuso, no qual se incluem a definição das relações entre valores, princípios e regras, aspectos da chamada nova hermenêutica e a teoria dos direitos fundamentais.

Neste mesmo sentido, pondera Machado Neto que:
Assim é que, hoje, de posse das importantes descobertas da fenomenologia e da filosofia dos valores, da existência e da cultura, já é possível dar por superado o jusnaturalismo, como expressão pré-científica de fundamentação da ciência jurídica. Hoje é possível já ver claro nesse setor, e concluir que o direito natural, longe de ser ciência, era apenas ideologia, tolerável num tempo em que os instrumentos teóricos da filosofia não tinham ainda sido convenientemente elaborados para a exploração fecunda do problema dos valores, e hoje inteiramente superada pela fundamentação da axiologia jurídica, que é a tarefa a mais premente e grandiosa que os nossos tempos estão a esperar e a exigir dos filósofos do presente.

Neste novo cenário, tornou-se possível o diálogo do Direito com os valores, diferentemente do quanto apregoado pelo positivismo, que previa a separação da ciência jurídica com a axiologia.
Explica Luis Roberto Barroso que:
Para poderem beneficiar-se do amplo instrumental do Direito, migrando da filosofia para o mundo jurídico, esses valores compartilhados por toda a comunidade, em dado momento e lugar, materializam-se em princípios, que passam a estar abrigados na Constituição, explícita ou implicitamente. Alguns nela já se inscreviam de longa data, como a liberdade e a igualdade, sem embargo da evolução de seus significados. Outros, conquanto clássicos, sofreram releituras e revelaram novas sutilezas, como a separação dos Poderes e o Estado democrático de direito. Houve, ainda, princípios que se incorporaram mais recentemente ou, ao menos, passaram a ter uma nova dimensão, como o da dignidade da pessoa humana, da razoabilidade, da solidariedade e da reserva de justiça.

Os direitos fundamentais, nesta perspectiva, são enxergados não como valores universais e atemporais, advindos de uma razão natural, mas sim como frutos de uma construção de origem histórico-cultural, baseando-se nos valores expressos através dos princípios.
Neste sentido, esclarece Eduardo Bittar :
Não se pode dizer que a pós-modernidade abole a modernidade, e nem mesmo que as distorções no uso dos direitos humanos redundam numa negação desta categoria de direitos. Pelo contrário, seus fundamentos mudaram, não se trata mais de verifica-los como revelações da Razão, como instâncias universais, como valores atemporais, mas como construtos histórico-culturais de profunda significação para a garantia e preservação da dignidade da pessoa humana.

Pelo exposto, evidente é o fato de que não se pode sucumbir, aqui, a tentação de vincular a existência de direitos fundamentais a um valor pré-existente, em resgate de um jusnaturalismo divino e/ou racional, pois se acredita que é possível, sim, esboçar um conceito positivo para os direitos fundamentais, baseando-se em valores-guias.
A noção primeira sobre o tema parte da idéia da existência de um conteúdo fundamental destes direitos.

2.2. A EXISTÊNCIA DE UM CONTEÚDO MATERIAL DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS

Oscar Vilhena Vieira defende que os direitos fundamentais correspondem ao conjunto de direitos da pessoa humana reconhecidos de forma expressa ou implícita pela CF/88 .
Enquanto isto, Dirley da Cunha Júnior vincula o conceito à noção de normas que disciplinam toda a atuação estatal, impondo a este o dever de “proteger a vida humana, no seu nível atual de dignidade, buscando realizar, em última instância, a felicidade humana” . Tais direitos possuem, de acordo com o referido pensamento, lastro no princípio da dignidade da pessoa humana. A mesma idéia é obtida por Ana Cristina Costa Meireles, que ensina que os direitos fundamentais são “densificações normativas” daquele princípio .
Já Robert Alexy recorre ao positivismo para determinar o que sejam normas de direito fundamental, trazendo uma resposta compatível com a coerência interna da Constituição alemã: é fundamental a norma prevista em critério formal, que corresponde a um critério de positivação pré-estabelecido . Logo, a definição primeira do que seja direito fundamental cabe muito mais a uma atuação política e não meramente interpretativa de um determinado conteúdo.
Isto não implica que Alexy propugne ser este sistema de direitos fundamentais um sistema fechado. Ao revés, defende a existência de normas não diretamente enunciadas pela Constituição com conteúdo fundamental, que nomeia como “normas de direito fundamental atribuídas”.
Assim, para este autor, existem dois grupos de normas de direitos fundamentais: as estabelecidas diretamente pelo texto constitucional e as atribuídas .
Tal, para Ingo Wolfgang Sarlet, corresponde à idéia de um catálogo constitucional de direitos fundamentais. O que varia, entre Sarlet e Alexy, é o grau de abertura conferida ao catálogo: mais amplo para o primeiro (Sarlet), mais restrito para o segundo (Alexy).
Na realidade, o pensamento de Alexy pode ser elucidado a partir da concepção de que estes direitos podem ser divididos em dois grandes conjuntos, organizados de acordo com sua fonte jurídica, ou seja, tendo por fundamento os mecanismos e os meios pelos quais estas normas surgem ou se afirmam.
O grupo inicial corresponde aos direitos “formalmente” fundamentais, estabelecidos a partir de opção legislativa, e o derradeiro aos direitos “materialmente” fundamentais, identificados como portadores de conteúdo que conecta a um valor fundamental.
Também Gomes Canotilho adere à noção de direitos fundamentais como direitos constitucionalmente positivados, de onde se derivam consequências jurídicas . Tal qual Alexy, também não preceitua Canotilho que estes direitos constituam um sistema fechado. Seu pensamento defende a existência de um sentido formal dos direitos fundamentais positivados, dos quais se derivam outros direitos (fundamentais em sentido material).
Sob o prisma focal meramente histórico, estes dois autores concebem os direitos fundamentais como inicialmente um sistema formalista, ao que a atividade legislativa e interpretativa exerce um papel de derivação (ou atribuição) de outros direitos, que são fundamentais em razão do seu conteúdo (essência).
Questiona-se: como um positivista da magnitude de Alexy poderia defender a existência de tais normas atribuídas? Responde-se: exigindo, como critério de validade intransponível, que exista uma referência a direitos fundamentais (estes sim positivados) nestas normas atribuídas. Logo, o seu surgimento decorre da evolução interpretativa de uma norma efetivamente estabelecida .
Esta consideração evoca duas conclusões: para o sistema, correspondendo à insegurança relativa, pois é impossível determinar com exatidão qual é o rol dos direitos fundamentais, o que seria negativo do ponto de vista da certeza que se espera na defesa dos direitos fundamentais (e da sua atuação como limite interpretativo e legislativo). Com certeza, a tarefa de interpretar e legislar se torna ainda mais complexa diante da obrigação de não contrariar algo que não se sabe exatamente o que é ou como se delimita.
Em outro diapasão, corresponde a meio de criação de novos direitos fundamentais , que serão desdobramento dos já estabelecidos, permitindo a evolução do sistema e o atendimento das finalidades propostas pelo Estado. E nesta linha, é deveras positivo, mesmo porque, dentro de uma lógica de maximização da efetividade destes direitos, é muito mais preocupante a sua não aplicação do que o estabelecimento de novos mecanismos de contenção ou defesa.
Em arremate, Ingo Sarlet aponta que são igualmente direitos fundamentais as posições jurídicas que se referem a pessoas, tendo como base os direitos positivados no texto constitucional e, portanto, retirados do ámbito de disponibilidade dos poderes constituídos, bem como os dispositivos que, por seu conteúdo, importância e significado, se equiparam ao primeiros. Logo, não se confundem com disposições contidas apenas na Carta Constituicional em sentido formal, adequando-se às previsões contidas na denominada “Constituição material”.
Tal significa que também este autor defende a existência de um rol de direitos fundamentais não restrito ao texto constitucional, mas pertencente a um sentido material de fundamentalidade.
Diante dessas conclusões, faz-se mister delimitar o contorno dos direitos fundamentais em sentido material, visando a alcançar o fundamento que permite a sua criação (seja por um processo de atribuição, derivação, equiparação ou geração de direitos) na sociedade contemporânea.

3. FUNDAMENTOS DE MATERIALIDADE DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS

Robert Alexy defende que a pertinência de uma norma atribuída ao sistema de direitos fundamentais decorre da sua relação com uma norma do mesmo gênero que esteja positivada no ordenamento jurídico.
Trata-se, portanto, de uma regra de coerência interna.
Há, porém, quem apresente um fundamento externo ao catálogo de direitos fundamentais positivados como raiz destes direitos, quando considerados apenas sob o ponto de vista da sua materialidade. É a concepção segundo a qual os direitos fundamentais possuem um conteúdo que lhes é inerente. Como aponta Ingo Sarlet, “direitos fundamentais em sentido material são aqueles que, apesar de se encontrarem fora do catálogo, por seu conteúdo e por sua importância podem ser equiparados aos direitos formalmente (e materialmente) fundamentais.”
Neste contexto, a materialidade não decorreria da derivação de um direito positivado, mas sim da percepção de que um determinado valor é importante para uma determinada sociedade. Este valor é considerado de tal forma importante que lhe é outorgado o status de direito fundamental.
Propugnando por um exemplo desta corrente, Sarlet cita Hesse, para quem os direitos fundamentais são garantias pontuais destinadas à proteção de bens e posições jurídicas relevantes ou ameaçadas . Posição análoga é trazida por Felipe Derbli , no sentido de que a dignidade corresponde à proteção ao mínimo existencial.
Neste condão é também o que propõe José Afonso da Silva, ao identificar nos direitos fundamentais uma nota de essencialidade. Para este autor, a idéia de direito fundamental encerra um conteúdo sem o qual a pessoa humana não sobrevive, pois não se realiza ou convive com as demais pessoas . E é essa essencialidade que determina, ao lado do seu reconhecimento formal, a sua efetivação de forma material e concreta.
Consiste, portanto, no critério que leva em conta a coerência a valores-guia, não necessariamente inclusos como direitos fundamentais em um sistema positivado.
Dentre estes valores, dois são mais comumente apontados como base para um sistema de direitos fundamentais: a dignidade da pessoa humana e a idéia de soberania popular no Estado Democrático de Direito.
Mesmo não partilhando desta opinião, Ingo Sarlet informa o papel da dignidade da pessoa humana na configuração dos direitos fundamentais:
A idéia de que os direitos fundamentais integram um sistema no âmbito da Constituição foi objeto de recente referência na doutrina pátria, com base no argumento de que os direitos fundamentais são, em verdade, concretizações do princípio fundamental da dignidade da pessoa humana, consagrado expressamente em nossa Lei Fundamental.

Em seqüência lógica, cumpre tratar, portanto, primeiramente do conteúdo do princípio da dignidade da pessoa humana, cuidando-se em seguida do principio do Estado Democrático de Direito.

3.1. O PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA

O estudo do princípio da dignidade da pessoa humana percorre necessariamente dois caminhos.
O primeiro diz respeito à sua importância no ordenamento jurídico brasileiro, na qualidade de valor fundante de outros direitos e de inspiração normativa. O sentido desta análise é delimitar bem as hipóteses de utilização e recurso ao princípio em estudo.
O segundo caminho diz respeito ao conteúdo universalizante do instituto, que deve ser buscado em detrimento da sua utilização espiritual. Neste sentido, se recorre ao instituto a partir da sua formação filosófica e ontológica.

3.1.1 O CONCEITO DA DIGNIDADE SOB A ÓTICA JURÍDICA DO ORDENAMENTO BRASILEIRO

No decorrer do Século XX, houve uma tendência de inclusão dos princípios fundamentais do Direito nas constituições dos países de tradição romano-germânica.
Tanto é que no Brasil, a Constituição Federal de 1988 incluiu, como fundamento da República Federativa do Brasil, o princípio da dignidade da pessoa humana .
Neste caminho, a prestigiada posição alçada pela dignidade da pessoa humana , nos termos e na forma proposta pela Constituição Federal brasileira, irradia sua eficácia a todo o ordenamento jurídico pátrio, demonstrando, especialmente no que concerne às relações privadas, a alteração de seu enfoque ao desprestigiar a autonomia e o patrimônio em nome do reconhecimento da necessidade de proteção do homem, visto em sua essência.
Considera-se característica própria de um sistema de direitos fundamentais a sua possibilidade de ampliação. Neste ponto, o trabalho analítico do legislador constituinte brasileiro é digno de louvor, uma vez que logrou formalizar um número elevado de direitos fundamentais disciplinados pela proteção da positivação no texto constitucional.
Em decorrência disto, o sistema brasileiro de direitos fundamentais pode ser considerado, hoje, superior aos que lhes antecederam, o que traz a noção de que o Estado brasileiro tornou-se mais democrático. “A amplitude do catálogo dos direitos fundamentais, aumentando, de forma sem precedentes, o elenco dos direitos protegidos, é outra característica preponderantemente positiva digna de referência” .
Não há a menor sombra pálida de dúvida quanto a esta afirmativa diante da possibilidade de integração dos direitos fundamentais realizada através de um processo criativo destas normas, respeitando-se, ao mesmo tempo, tanto a idéia de pertinência a um conteúdo específico (materialidade), quanto a referência a uma norma positivada (formalidade), superando-se qualquer resquício de vinculação necessariamente espiritual ou divina na sua tutela.
Por esta razão, o reconhecimento da dignidade da pessoa humana implica na necessidade de reconstrução do sistema, especialmente na ótica civil-constitucional. Neste sentido, propõe Maria Celina Bodin de Moraes :
Para a adequada e coerente reconstrução do sistema, impõe-se ao civilista o desafio de restabelecer o primado da pessoa humana em cada elaboração dogmática, em cada interpretação e aplicação normativas. A transposição de normas diretivas do sistema de Direito Civil para o da Constituição acarretou relevantíssimas conseqüências jurídicas que se delineiam a partir da alteração da tutela, que era oferecida pelo Código ao “indivíduo”, para a proteção, garantida pela Constituição, à dignidade da pessoa humana, elevada à condição de fundamento da República Federativa do Brasil. O princípio constitucional visa garantir o respeito e a proteção da dignidade humana não apenas no sentido de assegurar um tratamento humano e não-degradante, e não conduz exclusivamente ao oferecimento de garantias à integridade física do ser humano. Dado o caráter normativo dos princípios constitucionais, princípios que contêm os valores ético-jurídicos fornecidos pela democracia, isto vem a significar a completa transformação do Direito Civil, de um Direito que não mais encontra nos valores individualistas codificados o seu fundamento axiológico.

Afinal, com o advento do Novo Código Civil Brasileiro numa leitura civil-constitucional, já é possível enxergar uma alteração na tendência de seu enfoque, reduzindo a importância dada às situações patrimoniais em nome da prevalência da situação extrapatrimonial, uma vez que a proteção humana deve ser prioritária.
Neste caminhar, o intérprete deve fazer-se valer desta nova orientação, aplicando a norma jurídica, numa perspectiva integrativa civil-constitucional, no intuito de que seja tutelada, sempre prioritariamente, a dignidade da pessoa humana na resolução das lides postas em análise.
Esse processo de re-conformação do ordenamento, que pressupõe a derivação de direitos fundamentais, oferece o risco de alheamento dos direitos fundamentais a partir da utilização do valor guia da dignidade da pessoa humana dentro de uma visão espiritualista.
Como visto linhas acima, a dignidade humana , com a Constituição de 1988, veio a ser jurisdicionalizada , alcançando o patamar de fundamento da República Federativa Brasileira para efetivamente influenciar toda a ordem jurídica.
Daí a dificuldade encontrada pela doutrina de delimitar os contornos e limites desta dignidade, uma vez que ela baseia a ordem jurídica em todos os seus diferenciados campos de regulação.
Maria Celina Bodin de Moraes , neste sentido, propõe o desdobramento do “substrato material da dignidade” em quatro postulados, a saber:
i) o sujeito moral (ético) reconhece a existência dos outros como sujeitos iguais a ele, ii) merecedores do mesmo respeito à integridade psicofísica de que é titular; iii) é dotado de vontade livre, de autodeterminação; iv) é parte do grupo social, em relação ao qual tem a garantia de não vir a ser marginalizado. São corolários desta elaboração os princípios jurídicos da igualdade, da integridade física e moral – psicofísica -, da liberdade e da solidariedade.

Nesta perspectiva, a dignidade, explica a aludida autora, viria à tona, no caso concreto, quando realizada a concretização destes postulados, visando a ampla defesa dos direitos da personalidade decorrentes do princípio da dignidade.
Sobre a personalidade, ensina Maria Celina Bodin de Moraes :
A personalidade é, portanto, não um “direito”, mas um valor, o valor fundamental do ordenamento, que está na base de uma série (aberta) de situações existenciais, nas quais se traduz a sua incessantemente mutável exigência de tutela. Por isso, não pode existir um número fechado (numerus clausus) de hipóteses tuteladas: tutelado é o valor da pessoa, sem limites, salvo aqueles postos no seu interesse e no interesse de outras pessoas humanas.

Assim, os direitos da personalidade estão garantidos pelo princípio da dignidade humana, alcançando a pessoa humana o posto de valor fundamental do ordenamento.
Necessário se faz, por oportuno, recorrer ao fundamento jurídico e filósofico da dignidade da pessoa humana, no intuito de que sejam alcançados seu contorno e sua limitação.

3.1.2 O CONCEITO DA DIGNIDADE SOB A ÓTICA FILOSÓFICA

O conteúdo de dignidade da pessoa humana nem sempre foi o mesmo, tendo tido grande evolução no pensamento filosófico ocidental.
Originalmente, dignidade se referia a possuir uma posição dentro de uma hierarquia socialmente reconhecida . Em momento posterior, conclui-se que a vida humana enseja uma proteção diferenciada. Assim, a tutela conferida ao valor vida passou a exigir a presença de uma especial qualificação.
Com o objetivo de definir esta qualificação, verifica-se que as duas grandes correntes da ética (relativismo e objetivismo) passam a considerar a vida humana sob um novo ponto de vista. Assim, o valor que será objeto da corrente relativista é a qualidade de vida, ao passo que a teoria objetivista irá debruçar-se sobre a questão da dignidade da vida.
Logo, para o relativismo, o respeito à vida humana será analisado sob o prisma do utilitarismo (sentir prazer ou não sentir dor), da cognição (capacidade de tomada de decisões) ou do contratualismo (participação no contrato social). A principal decorrência da aplicação da teoria relativista é a conclusão de que nem toda vida deve ser respeitada, mas tão somente aquelas em que está presente um elemento axiológico, que é a “qualidade de vida” .
Por outro viés, para a corrente objetivista, a ilação natural da condição de humanidade é o reconhecimento de que a vida possui uma dignidade intrínseca, razão pela qual deverá ser respeitada. Tal respeito é uma decorrência lógica da mera condição de ser humano, não importando o seu grau de desenvolvimento, mas sim a sua pertinência à espécie humana. Portanto, o reconhecimento de que é preciso proteger o homem enquanto pessoa se dá mediante a identificação da sua individualidade. O ser humano é um ser dotado de espírito e, por esta razão, sua vida é considerada digna e merece ser protegida .
Seguindo uma lógica de maximização dos efeitos dos direitos fundamentais, parece ser mais coerente aceitar a premissa trazida pela corrente objetivista de que todo ser humano é digno. Como decorrência da sua dignidade, ao ser humano é aplicável uma proteção jurídica, cujo conteúdo foi delimitado por Kant. É este autor que defende que o ser humano possui uma dignidade ontológica: “a dignidade da humanidade consiste precisamente na aptidão que ela possui para estatuir leis universais, embora com a condição de simultaneamente estar sujeita a esta legislação.” .
Deste trecho, extrai-se que a dignidade possui, ao mesmo tempo, duas características. Conforme a primeira, trata-se de um valor criado pela humanidade e que se pretende universal. De acordo com a segunda, tem-se que se destina à tutela da própria humanidade, nela encontrando o seu objeto e a sua razão de ser. Portanto, trata-se de um valor ao mesmo tempo direcionado e oponível ao próprio ser humano.
As reflexões sobre a dignidade feitas por Kant influenciaram e prevalecem no pensamento filosófico da atualidade.
Neste caminho, fazendo alusão a Kant, sustenta Martins que: “em termos filosóficos-constitucionais parece haver um certo consenso no sentido de se considerar o princípio da dignidade da pessoa humana a partir da sua construção teórica”.
O fundamento kantiano baseia-se na premissa de que o homem, como ser racional, deve ser entendido como um fim em si. Assim, sustenta Kant :
Ao invés, os seres racionais são chamados pessoas, porque a natureza deles os designa já como fins em si mesmos, isto é, como alguma coisa que não pode ser usada unicamente como meio, alguma coisa que, conseqüentemente, põe um limite, em certo sentido, a todo livre arbítrio (e que é objeto de respeito). Portanto, os seres racionais não são fins simplesmente subjetivos, cuja existência, como efeito de nossa atividade, tem valor para nós; são fins objetivos, isto é, coisas cuja existência é um fim em si mesma, e justamente um fim tal que não pode ser substituído por nenhum outro, e ao serviço do qual os fins subjetivos deveriam pôr-se simplesmente como meios, visto como sem ele nada se pode encontrar dotado de valor absoluto.

Impõe ele, para tanto, um imperativo prático que prevê que a humanidade deve ser tratada sempre como fim, e não como um meio para algo. E, neste caminho, o homem deve ser visto como um sujeito criador, capaz de criar suas próprias leis, impondo-as a si mesmo dentro de um ambiente de união sistêmica por meio de leis comuns. Explica Kant que :
Os seres racionais estão todos sujeitos à lei, em virtude da qual cada um deles nunca deve tratar-se a si e aos outros como puros meios, mas sempre e simultaneamente como fins em si. Daqui brota uma união sistêmica de seres racionais por meio de leis objetivas comuns, ou seja, um reino o qual atendendo a que tais leis têm precisamente por escopo a relação mútua de todos estes seres, como fins e como meios, pode ser denominado reino dos fins (o que, na verdade, é apenas um ideal). Mas um ser racional pertence, na qualidade de membro, ao reino dos fins, pois que, muito embora ele promulgue leis universais, no entanto está sujeito a essas leis. Pertence-lhe na qualidade de chefe, enquanto, como legislador, não está sujeito a nenhuma vontade alheia.

É esta relação mútua, dentro do chamado reino dos fins, que impõe a necessidade de agir neste sentido. Nas palavras de Kant : “procede assim, não tendo em vista qualquer outro motivo prático ou vantagem futura, mas levada pela idéia de dignidade de um ser racional que não obedece a nenhuma outra lei que não seja, ao mesmo tempo, instituída por ele próprio”.
Cuida-se, portanto, de um conceito essencialmente aplicável ao homem enquanto ser social. Por meio da dignidade, o homem afirma a própria existência, sendo reconhecido pelos demais homens, que lhe apreciam e conferem valor . Como conclusão de que o princípio da dignidade é um princípio socialmente aplicável, tem-se que o mesmo se realiza por meio do reconhecimento da autonomia do alter, que é livre e possuidor de direitos idênticos aos dos demais seres humanos que o cercam .
Como há de se demonstrar, a dignidade da pessoa humana não se confunde com os direitos fundamentais, mas será a condição necessária para sua aplicação. É o que entende José Afonso da Silva, para quem “dignidade da pessoa humana é um valor supremo que atrai o conteúdo de todos os direitos fundamentais do homem, desde o direito à vida” .
Logo, o princípio tem por finalidade estatuir que todos os homens estão em mesma situação jurídica, o que decorre do fato de pertencer a uma mesma natureza, que é dita humana. Segundo Andorno :
Con tal principio se quiere destacar que ya no se admite actualmente la existencia de hombres de segunda categoria, se sub-humanos, de vidas sin valor vital. Es suficiente con ser hombre para ser reconecido como persona. Todos los hombres son igualmente dignos, em razon de su naturaleza común. Ser digno equivale, por tanto, a ser persona.

Ao preceituar uma proteção, a dignidade implica o reconhecimento da igualdade dos homens, e desta decorre que nenhuma pessoa possui poderes para interferir na autonomia de outra.
Por derradeiro, como aduz Velázquez , não se pode invocar a condição social, nem interpretações subjetivas restritivas, tampouco o utilitarismo como forma de limitar o acesso à dignidade. Por decorrer unicamente da condição humana da pessoa, não se admite que um homem limite a dignidade de outro.
O critério para o efetivo reconhecimento da tutela trazida pela concepção axiológica da dignidade somente pode ser a humanidade, posto ser ela o bem jurídico tutelado por este valor. É o valor do homem enquanto ser humano e pelo fato mesmo de ser homem .
Este é o delineamento que lhe confere Kant, para quem o fato de o ser humano atuar como o legislador da dignidade o converte imediatamente no primeiro súdito desta regra. Portanto, mesmo se superada a moral que dá origem ao princípio da dignidade, este restará como limite intransponível pelo ser humano, permanecendo prestigiado em seu posto de valor máximo. O homem é o meio e o fim do significado da dignidade da pessoa humana .
Dentro desta reflexão, refuta Kant qualquer tentativa de coisificação do ser humano, garantindo ele a posição de destaque do ser racional humano ao sustentar que o mesmo estaria acima de todo e qualquer preço, não admitindo equivalente, por ter uma dignidade. Neste sentido, destaca Kant : “o que constitui a só condição capaz de fazer que alguma coisa seja um fim em si, isso não tem apenas simples valor relativo, isto é, um preço, mas sim um valor intrínseco, uma dignidade”.
O ser racional humano é dotado de dignidade, que o faz insubstituível e o faz livre para elaborar sua própria lei, que o regerá, inclusive, impondo-o deveres. Isto significa dizer, nas palavras de Martins , que: “o homem precisa do dever para tornar-se um ser moral, pois obedecê-lo consiste em obedecer a si mesmo, na medida em que foi o próprio ser humano que consciente e racionalmente estabeleceu o dever”. Sobre esta moralidade, disciplina Kant :
Ora, a moralidade é a única condição capaz de fazer que um ser racional seja um fim em si, pois só mediante ela é possível ser um membro legislador no reino dos fins. Pelo que, a moralidade, bem como a humanidade, enquanto capaz de moralidade, são as únicas coisas que possuem dignidade. (...). Esta estimação leva-nos a reconhecer o valor de tal maneira de pensar como uma dignidade, e coloca-a infinitamente acima de todo o preço, com o qual não pode ser nem avaliada nem confrontada, sem que de algum modo se lese sua santidade.

Tal postura revela o perfil antropológico adotado por Kant em suas reflexões, pois somente a racionalidade da pessoa humana é que justificaria o seu reconhecimento como fim em si mesmo e de sua dignidade, atribuindo-lhe um valor superior a qualquer “preço”, não admitindo qualquer substituto equivalente. Ademais, é certo também que, neste quadro, a dignidade da pessoa humana decorre também do fato de que, em decorrência de sua racionalidade, o ser humano tem autonomia para seguir o quanto disciplinado pela legislação universal criada no reino dos fins. Neste caminho, dispõe Kant :
De fato, nenhuma coisa possui valor, a não ser o que lhe é assinado pela lei. Mas a própria legislação, que determina todos os valores, deve ter, justamente por isso, uma dignidade, isto é, um valor incondicionado, incomparável, para o qual só o termo respeito fornece a expressão conveniente da estima que todo ser racional lhe deve tributar. A autonomia é, pois, o princípio da dignidade da pessoa humana, bem como de toda a natureza racional.

Indubitável que o ser humano diferencia-se de todos os outros seres por uma qualidade própria. Preocupa-se o ser humano, de uma forma geral, não apenas em compreender-se, como também em compreender o outro, esforçando-se para suprir suas necessidades e da sociedade.
Tratando desta distinção do ser humano, esclarece Maria Celina Bodin de Moraes :
Para distinguir os seres humanos, diz-se que detêm uma substância única, uma qualidade própria apenas aos humanos: uma “dignidade” inerente à espécie humana. A raiz etimológica da palavra “dignidade” provém do latim dignus – “aquele que merece estima e honra, aquele que é importante”; diz-se que sua utilização correspondeu sempre a pessoas, mas foi referida, ao longo da Antiguidade, apenas à espécie humana como um todo, sem que tenha havido qualquer personificação.

Neste sentido, pondera Callejo :
Los derechos a la vida, a la integridad física y moral, al honor; a la intimidad, a la libertad de expresión, ideológica, etc, solo tiene sentido porque son exigência de uma idea de la persona como ser revestido de uma dignidad humana que le diferencia de otros seres vivos de los que no se predican esos derechos y dignidad. Los tratadistas del Derecho Político, salvo alguna posición positivista muy minoritária, coinciden em esta idea de la dignidad como valor prévio de la persona, dimanante del derecho natural.

Tal visão parece ter se solidificado na maior parte dos ordenamentos constitucionais a partir da ratificação da Declaração Universal dos Direitos Humanos. Esta petição de princípios, inegavelmente ciente do risco inerente à declaração de superioridade de um ser humano sobre outro, teve por fim afirmar a igualdade de todos os seres humanos, ao menos no que toca ao reconhecimento da dignidade de toda a humanidade.
Discorrendo sobre esta carta política internacional, Velázquez destaca como sua principal vitória a noção de que todas as pessoas são portadoras de direitos. Complementar a este raciocínio, Alarcón atesta que “a tendência dos ordenamentos constitucionais foi pautar-se pelo reconhecimento do homem como o centro e o fim do direito” .
Inexistem duas dignidades distintas, nem se pode estabelecer graus entre a proteção conferida a um ser humano e outro. Como bem observa Roberto Andorno, “la dignidad ontológica es una cualidad inseparablemente unida al ser mismo del hombre, siendo por tanto la misma para todos. [...] En este sentido, todo hombre, aun el peor de los criminales, es un ser digno” .
Isto se dá diante da impossibilidade de se conceber a dignidade sob qualquer ponto de vista, que não o humano. O legislador da dignidade é necessariamente o homem, que, pela concessão deste direito ao outro, recebe-o de forma reflexa; o conteúdo do valor dignidade é justamente o reconhecimento do ser humano como portador de direitos. Trata-se de uma prerrogativa que é concedida pelo homem a ele próprio, enquanto tal, realizando, assim, a sua essência ontológica.
Velázquez crê que “el mejor escudo contra las violaciones de la dignidad son los derechos humanos. Pero la dignidad hay que assegurarla también por dentro. Lo que esta em juego es la idea misma de ser humano.” .
Ingo Wolfgang Sarlet não fundamenta diretamente no princípio da dignidade da pessoa humana todos os direitos fundamentais, e não o faz em razão de optar por um conteúdo diverso do que seja dignidade: “também os direitos fundamentais de nossa Constituição não radicam, em sua totalidade, ao menos não de forma direta, no princípio da dignidade da pessoa humana.” .
Esta visão é de que o rol de direitos fundamentais é extremamente amplo para ter pertinência direta a um só tema, ao que alguns destes direitos teriam correlação não-imediata com o princípio da dignidade da pessoa humana (embora todos sejam, sem sombra de dúvida, concretizações deste princípio) .
Todavia, parece correto enunciar que é a dignidade que assegura a realização dos direitos humanos, haja vista que a verificação da proteção jurídica exige o prévio reconhecimento como sujeito de direito.
Defende Canotilho que o fundamento “dignidade da pessoa humana” na estrutura da Constituição Portuguesa pode ser reconhecida nos cinco elementos identificados por Podlech: afirmação da individualidade; garantia de livre desenvolvimento da personalidade; criação de mecanismos de socialidade e manutenção de mínimos existenciais; garantia da autonomia individual e igualdade jurídica-social dos cidadãos.
A principal conclusão do autor é que a estrutura da Constituição Portuguesa parte de uma base antropológica, do qual se extrai a defesa do homem, a um só tempo, como cidadão, como pessoa, como administrado e como trabalhador . Ou seja, a raiz dos direitos fundamentais constitucionais está na proteção ao ser humano, em suas diversas dimensões.
Acredita-se que tais considerações apontadas para a Carta Política portuguesa podem ser estendidas em grande parte ao sistema constitucional brasileiro (e, quiçá, ao espanhol!), ante à identidade do valor-guia “dignidade da pessoa humana” nos dois sistemas.
Não se pode olvidar que o principal bem jurídico tutelado pelo ordenamento é o respeito ao homem. Tal se dá mediante o reconhecimento da dignidade que lhe é intrínseca, permitindo que seja sujeito de direitos, em igualdade de condições com os demais seres humanos.
Mas não é somente a dignidade da pessoa humana o fundamento de materialidade que confere base aos direitos fundamentais.
Para garanti-la, mister se faz um Estado efetivamente organizado.
Por isso, é preciso compreender também o principio do Estado Democrático de Direito como fundamentação e garantia dos direitos fundamentais.

3.2. O PRINCÍPIO DO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO

Ao lado do pensamento que embasa os direitos fundamentais na dignidade da pessoa humana, deve ser trazido, como fundamento de materialidade destes direitos, o princípio do Estado Democrático de Direito.
Define Ingo Sarlet que o Estado Democrático de Direito tem como fundamento a existência da segurança jurídica, que atua como espécie de freio ao despotismo e à prática de iniqüidades. Eleva, assim, a segurança jurídica ao status de “subprincípio concretizador do princípio fundamental e estruturante do Estado de Direito” .
A ligação dos direitos fundamentais com o princípio democrático, no seu viés de autodeterminação dos povos (soberania popular), é trazida por Sarlet como uma tríplice vertente: ao mesmo tempo, encerram pressuposto, garantia e instrumento deste princípio.
Democracia relaciona-se com a própria lógica de direitos fundamentais, já que a exigência do preenchimento de determinados direitos envolve, a um só tempo, a participação popular e, a partir da idéia de liberdade, exige-se a criação da transparência . Logo, de acordo com Canotilho, uma sociedade em que se garantem os direitos fundamentais é também uma sociedade efetivamente democrática.
Ingo Sarlet apresenta posição em sentido análogo, defendendo serem os direitos fundamentais um dos elementos constitutivos da Constituição (em sentido material), já que versam também sobre a estrutura básica do Estado e da Sociedade.
José Afonso da Silva, por sua vez, aponta que os direitos fundamentais “são direitos que nascem e se fundamentam, portanto, no princípio da soberania popular” , reforçando assim sua natureza de elementos constitutivos do Estado Democrático de Direito. Por soberania popular, entende-se a legitimação do Estado por meio da atribuição do poder ao próprio povo . Logo, na medida em que atende às expectativas do povo, o Estado alcança sua almejada legitimidade.
Tais direitos correspondem também ao que se pode chamar de essência do Estado Constitucional, já que se revestem de fundamentalidade a forma de Estado, a organização do poder e a definição do sistema de governo. Sarlet os denomina, dentro desta concepção de direitos fundamentais enquanto representação do princípio democrático, como elementos nucleares da Constituição material .
Em verdade, não existe uma relação de oposição entre os dois fundamentos apontados. No sistema constitucional brasileiro, verifica-se que ambos direcionam-se para uma mesma noção, sendo igualmente fundamentos do Estado brasileiro.
Como ensina Ingo Sarlet , alcançar a dignidade da pessoa humana é uma das tarefas impostas ao Estado, que o fará por meio de “ações tanto no sentido de preservar a dignidade existente ou até mesmo de criar condições que possibilitem o pleno exercício da dignidade”. É correta a opinião deste autor quando preceitua que a obtenção da dignidade depende da ordem comunitária, nem sempre sendo possível ao indivíduo realizar, por si só, suas necessidades existenciais básicas. Tal resultado é obtido, muitas vezes, com o concurso do Estado ou da comunidade.
Logo, por aplicação da teoria contratualista do Estado, observa-se que a dignidade da pessoa humana é uma das finalidades que autorizam a outorga de poder a este ente. Portanto, a legitimidade do Estado Democrático de Direito está diretamente ligada à aplicação do princípio da dignidade da pessoa humana . Este é o seu principal objetivo , sem o qual não há justificativa para a submissão do indivíduo ao ente estatal.
Foi reconhecido à dignidade um caráter de norma de regulamentação, frente à qual deve ser analisada a validade das demais normas. Por esta razão, Alarcón conclui que, do ponto de vista formal, o princípio da dignidade guarda um valor de pré-compreensão da estrutura do Estado jurídico brasileiro, sendo muito mais do que o conceito de enunciado principiológico .
Alarcón defende que “o princípio da dignidade da pessoa humana não apenas é fundamento do Estado Democrático de Direito, mas valor constitucional.” . Para Ingo Wolfgang Sarlet, vai além: é o valor-guia não só dos direitos fundamentais, como também de toda a ordem constitucional .
Deixando de lado a discussão sobre qual dos dois valores exerce papel de raiz sobre o outro, há que se registrar que os dois conceitos (democracia e dignidade da pessoa humana) traduzem, ao final, um mesmo valor: igualdade jurídica e social.
Nessa linha, é o que também se extrai de Edvaldo Brito, que fundamenta os direitos fundamentais em uma idéia de igualdade, que seria o próprio vetor do desenvolvimento destes direitos . Este pensamento termina por concluir em sentido análogo à noção da dignidade da pessoa humana como base dos direitos fundamentais, em uma visão de dignidade Kantiana.
Por este motivo, defende-se que a fundamentalidade material decorre da realização da igualdade jurídica e social, logrando-se êxito, neste sentido, em alcançar um conteúdo não espiritual dos direitos fundamentais, a partir dos seus fundamentos de materialidade.
Logo, o processo de materialização dos direitos fundamentais, ao mesmo tempo em que corresponde ao pensamento de que existe uma especial importância no objeto tutelado por estas normas, corresponde também à atribuição de conteúdo referenciado com os guias axiológicos às normas positivadas.
Com isso, conduz-se a uma visão otimista da defesa dos direitos fundamentais no Brasil: o processo de derivação de direitos fundamentais pode alcançar simultaneamente a proteção material, no sentido de que os direitos fundamentais possuem natureza supralegal, estando no ápice do ordenamento; bem como a proteção formal, sujeitando estes direitos a limite de reforma constitucional, como cláusulas pétreas.
Não abarca, portanto, o pensamento jusnaturalista ou subjetivista do conteúdo destas normas. Afinal, seu fundamento possui previsão legal, inserta na grande maioria das constituições de origem romano-germânica. É exatamente o caso do Brasil.

4. CONCLUSÃO

No mundo contemporâneo, os direitos fundamentais são, para uns, o exemplo mais eloqüente da relevância do jusnaturalismo ainda nos dias atuais, especialmente quando se vinculam a conteúdos reconhecidos como de direitos humanos.
Todavia, o entendimento que predomina é o de que os direitos humanos se constituem em uma espécie de resquício jusnaturalista que fora capturado pelo Direito Positivo, merecendo, de maneira geral, grande espaço nos textos constitucionais.
Contudo, há um problema. Em que pese a sua estrita vinculação com a noção de humanidade e de personalidade, a sua utilização indiscriminada termina por enfraquecer o instituto, lhe retirando justamente o conteúdo universalizante.
É que os direitos humanos, neste sentido fundamental, acabam por assumir também a condição de um direito supranacional, um direito que nem mesmo as Constituições poderiam revogar ou deixar de adotar. Ou seja, uma espécie de "Justiça Universal" no sentido que Kant concebeu a idéia e Kelsen rapidamente percebeu.
O desafio de seu estudo na contemporaneidade é revestir estes institutos de conteúdo amplo o bastante para alcançar a eficácia plena, sem que, por outro lado, se percam em total subjetividade. Alcançar esta tênue medida é o desafio do intérprete, que deve fazê-lo sem recorrer à espiritualidade das normas.
Por isso, arremata-se este texto com a poética conclusão de Joaquín Herrera Flores:
Culturalmente hablando, ni el mal ni el bien proceden de algún topos uranos o esfera transcendental desde la que se nos impone una determinada forma de actuar moralmente. El mal reside en todo intento por despotenciar a los seres humanos en su capacidad social instituyente; mientras que el bien, no será otra cosa que la construcción de condiciones para que todas y todos tengamos el suficiente poder y autoridad para poner en práctica nuestra capacidad de lucha por la dignidad. El rey está desnudo. Imaginemos nuevos mundos. Construyamos las condiciones que nos permitam llegar a ellos. Empoderémonos mutuamente. Luchemos por los derechos humanos como procesos de lucha por la dignidad humana. Claves necesarias para la implementación efectiva y material de nuestra concepción cultural, contextual y conceptual de los derechos humanos como productos culturales .

É no próprio ser humano, como pessoa destinatária de dignidade, e no próprio Estado Democrático de Direito, titular do papel de garantidor desta dignidade, que reside a fundamentação e a epistemologia tanto dos direitos fundamentais quanto dos direitos humanos, em qualquer uma de suas acepções.

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